PPGCOM entrevista o Prof. Dr. Adriano Duarte Rodrigues
- 15 de jun. de 2013
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Em entrevista ao PPGCOM, o pesquisador fala sobre suas perspectivas de pesquisa em Comunicação
Entrevista cedida ao discente Antonio Carlos Fausto da Silva Júnior
Referência nos estudos em Comunicação, o pesquisador Adriano Duarte Rodrigues, professor catedrático da Universidade Nova de Lisboa (UNL), está em Belém (PA) desde meados de setembro realizando curso e seminário com professores e alunos do Programa de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia (PPGCOM) e professores da Faculdade de Comunicação (FACOM) da Universidade Federal do Pará (UFPA). Além dessas atividades, também estão sendo ofertadas palestras abertas à comunidade acadêmica e ao público externo ao Programa.
A presença do Prof. Dr. Adriano Duarte Rodrigues no Programa representa os primeiros passos rumo ao estabelecimento de um projeto de pesquisa entre o PPGCOM e o Departamento de Ciências da Comunicação da UNL, cujo curso de Comunicação foi criado pelo pesquisador no final da década de 1970.
Licenciado em Teologia e em Sociologia, Duarte Rodrigues aborda na entrevista como se deu o encontro com a Comunicação, a interdisciplinaridade do campo e os estudos desenvolvidos no Brasil. Na terceira visita à Faculdade de Comunicação da UFPA – a primeira foi no começo dos anos 1990 –, o pesquisador falou também sobre a importância do PPGCOM e da FACOM para a consolidação das pesquisas em Comunicação na Universidade.
A vinda do professor ao Programa conta com recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal do Pará (PROPESP-UFPA).
PPGCOM: O senhor é licenciado em Teologia e em Sociologia. Quando e como o senhor decidiu enveredar pela Comunicação?
Adriano Duarte Rodrigues: O início dos meus estudos de comunicação ficou a dever-se a circunstâncias que têm a ver com a minha história de vida. Quando terminei o curso de Sociologia, na Universidade de Estrasburgo, fui convidado, em 1971, para assistente da Universidade de Lovaina e, nessa ocasião, defini a minha pesquisa de doutorado na área da socio-semiótica. Nessa altura dediquei muito dos meus trabalhos aos estudos da narrativa. Quando terminei o doutorado na Universidade de Lovaina, em 1977, fui convidado para então recém-criada Universidade Nova de Lisboa e criei o curso de comunicação na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas desta Universidade. Os meus trabalhos desde então procuraram definir e enquadrar os objetivos da equipa que constituí e que tive a meu cargo durante mais de dez anos. Hoje a equipa que formei segue autonomamente o seu caminho, mas na sua origem dediquei todo o meu esforço ao enquadramento da nossa descoberta comum.
PPGCOM: O prefácio do livro de 2012 da Compós (Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação), "Mediação e Midiatização", é de sua autoria. Como o senhor avalia as discussões sobre a Comunicação realizadas atualmente no Brasil?
Adriano Duarte Rodrigues: Não tenho competência para fazer propriamente uma avaliação dos trabalhos dos meus colegas brasileiros. As instituições brasileiras têm excelentes instrumentos para fazer essa avaliação. Conheço muito bons trabalhos realizados pelos colegas de todo o Brasil e os trabalhos que tenho acompanhado prometem um futuro muito bom para os estudos brasileiros nas diferentes áreas da comunicação. Costumo referir muitas vezes artigos e estudos de colegas brasileiros aos meus alunos.
PPGCOM: Sabemos que os estudos em Comunicação não se restrigem ao campo dos media, ao aparato midiático. Nesse sentido, uma das linhas em que o senhor trabalha refere-se à comunicação interpessoal e a questão da interação. Para o senhor, qual é a importância dessa perspectiva levando-se em consideração a presença dos meios na vida social?
Adriano Duarte Rodrigues: Eu nunca restringi os estudos sobre comunicação ao estudos dos media. Para mim os estudos sobre comunicação pertencem ao domínio mais vasto dos estudos que têm como objeto os processos de interação que constituem a experiência da espécie humana. É por isso que sempre dei muita importância aos estudos da pragmática e da interação discursiva. Creio que estes estudos ganham em estar inseridos, tanto teórica como metodologicamente, nas abordagens antropológicas. Os dispositivos mediáticos, como eu prefiro chamar àquilo que no Brasil se designa a mídia, são por isso objetos técnicos, tais como a escrita, o telefone, o celular, a radio, a televisão, de que os seres humanos se apropriam para constituir aquilo que designo por comunidade de reconhecimento mútuo ou por comunidade de fala.
PPGCOM: Quais ganhos a abordagem antropológica proporciona aos estudos de Comunicação?
Adriano Duarte Rodrigues: Os estudos de comunicação são por natureza de natureza interdisciplinar. A comunicação é mais uma perspetiva de estudo do ser humano, enquanto animal que depende completamente da interação com os outros para poder sobreviver, quer enquanto indivíduo quer enquanto espécie. A antropologia, como o próprio termo indica, é a ciência do ser humano em todas as suas vertentes. Neste sentido os estudos da comunicação são eminentemente estudos antropológicos, tal como o facto de os seres humanos serem animais que se distinguem pelo facto de falarem, os estudos da comunicação são eminentemente linguísticos, tal como pelo facto de os seres humanos pertencerem a uma espécie animal que constrói o seu mundo como um mundo social, os estudos da comunicação são eminentemente sociológicos.
Por seu lado, os ganhos que a comunicação consegue da abordagem antropológica é a disponibilidade para observar concretamente como os seres humanos constroem o seu mundo, como se comportam, como representam simbolicamente a sua experiência. A antropologia contribui para deixarmos de pensar o comportamento das pessoas a partir de categorias pré-concebidas pelo investigador. Assim, a pesquisa antropológica, sobretudo quando segue uma opção etnometodológica, contribui para despertar o nosso olhar para os saberes que as pessoas mostram e constroem quando interagem umas com as outras. A observação participante é uma excelente maneira de ultrapassar ideias feitas, de aprendermos com as pessoas os saberes que mobilizam para constituírem o seu mundo comum. É também importante o diálogo da comunicação com a antropologia para tomarmos consciência do facto de o objeto da pesquisa da comunicação ser a tentativa de decifrar o enigma da nossa espécie.

PPGCOM: A questão da experiência é recorrente nos seus estudos. O que o senhor entende por experiência e como ela está relacionada à comunicação?
Adriano Duarte Rodrigues: A resposta à pergunta anterior tem já também os ingredientes para a resposta a esta pergunta. No fundo o que os estudos da comunicação procuram é identificar a maneira como as pessoas constroem a sua experiência. Para mim, o estudo da comunicação é o estudo da maneira como, ao longo do processo de socialização, interiorizamos os saberes que nos permitem adotar os comportamentos apropriados a cada uma das circunstâncias da vida.
PPGCOM: O senhor defende que dispositivos são objetos técnicos que imitam o organismo humano. De que forma o dispositivo mediático realiza essa imitação?
Adriano Duarte Rodrigues: Os dispositivos mediáticos são uma das modalidades de dispositivos. Há também dispositivos ortopédicos inventados para serem utilizados em medicina e que os médicos utilizam para substituírem órgãos que falham ou se deterioram. O ideal técnico dos dispositivos é funcionarem sem darmos por eles e de só darmos por eles quando deixam de funcionar adequadamente. Os dispositivos mediáticos são dispositivos que intervêm na experiência da enunciação, isto é, da produção discursiva. Cada um destes dispositivos, desde a escrita alfabética, ao telefone, ao celular, à radio, à televisão, à internet, as diferentes instâncias da enunciação têm à sua disposição estes dispositivos para realizarem de maneira mais performativa aquilo que sem eles estaria limitado às condições da enunciação face a face da conversação imediata.
PPGCOM: O discurso também é objeto de estudo de outras áreas do conhecimento. No Brasil, por exemplo, a área de Letras também se debruça sobre a questão discursiva. Qual a especificidade de abordar o discurso sob o ponto de vista da Comunicação?
Adriano Duarte Rodrigues: O discurso é não só estudado na área das Letras; é também estudado por todas as ciências, inclusivamente pelas ciências da natureza, uma vez que não há ciência que não seja elaboração discursiva. O discurso é o objeto interdisciplinar por excelência e só o podemos compreender a partir da convergência do contributo de todas as ciências, uma vez que o discurso é a objetivação simbólica da experiência. Todas as ciências abordam evidentemente o discurso sob o ponto de vista da comunicação, uma vez que é na prática discursiva que os seres humanos interagem não só entre si, mas também consigo próprios.
PPGCOM: O senhor já esteve na UFPA noutras ocasiões, nas décadas de 1990 e 2000, mas esta é a sua primeira visita após o início das atividades do PPGCOM, que se deu em 2010. Qual a importância, na sua opinião, desse esforço de um programa recente de pós-graduação em estabelecer vínculos acadêmicos com pesquisadores de outras regiões e de outros países?
Adriano Duarte Rodrigues: A minha visão de Universidade implica inevitavelmente a competência para ministrar todos os graus de formação superior. Podemos dizer que a FACOM da UFPA se tornou Universidade quando começou a ministrar pos-gradução. Antes era uma escola superior média. A graduação é a transmissão dos saberes que outros investigadores descobriram; só a pos-gradução faz conhecimento novo e constitui uma comunidade de pesquisa, de amantes da descoberta. Agora a FACOM da UFPA é verdadeiramente uma escola universitária. Fico muito feliz por isso.
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